O combo de inflação, desemprego e abandono tem resultado no avanço da insegurança alimentar e da fome no Brasil. Para um país que se autoproclamava o “celeiro do mundo”, é profundamente triste a constatação de que recuamos vários degraus nos avanços sociais e na inclusão das classes menos favorecidas.
Com quase metade da população admitindo não saber se terá o que ingerir, dia após dia, a subalimentação é uma realidade nacional, chegando com força também às metrópoles.
As imagens publicadas em dois jornais cariocas de pessoas catando comida no lixo, em pleno Centro Rio, tiveram grande repercussão no Brasil e no mundo, ilustrando o que os números já indicavam: hoje, 33,1 milhões de brasileiros passam fome, quase o dobro do registrado em 2020.
Houve um incontestável agravamento do quadro. Apenas quatro em cada dez domicílios têm acesso pleno à alimentação, a chamada segurança alimentar.
Os números fazem parte do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PENSSAN).
Uma das soluções mais rápidas e viáveis para levar alimentos a toda população é combater o desperdício e estimular a produção. Boa parte dos produtos perecíveis já é descartada mesmo antes de chegar aos supermercados e feiras. São itens mal armazenados, manipulados da maneira incorreta ou inadequados à comercialização, mas ainda assim próprios para o consumo humano.
Quando fui secretário estadual de Desenvolvimento Regional, Abastecimento e Pesca, criei o programa Banco de Alimentos. A finalidade era justamente evitar o desperdício e combater à fome. Medidas simples, mas de largo alcance em se tratando de vidas.
No programa, diariamente, a equipe do Banco de Alimentos vai de box em box, em cada um dos pavilhões, para coletar com produtores e comerciantes doações de alimentos que não serão aproveitados para a venda. Um trabalho de formiguinha.
Depois de recolhidos, os alimentos passam pelo processo de seleção para, finalmente, serem embalados e encaminhados a mais de 120 instituições cadastradas em todo o Estado do Rio de Janeiro. Os produtos chegam também a cerca de 10 mil lares de nove comunidades carentes. No total, 36 mil famílias foram beneficiadas pela ação.
Houve ainda a ampliação da iniciativa por meio de editais do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (MDS), que possibilitaram ao Ceasa-RJ executar o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Com isso, além de estender o potencial do banco, a medida permitiu a compra de alimentos de 800 produtores cadastrados, fomentando a agricultura familiar, outra de minhas prioridades.
Não falta comida. Faltam logística e, muitas vezes, vontade de realizar. O Banco de Alimentos é apenas um dos muitos exemplos de iniciativas descomplicadas, que podem ser replicadas em todo território nacional, com grande potencial para fazer a diferença na vida da população sem recursos.
A fome mata, não podemos esperar. Alimento na mesa é direito de todos, é inadmissível que haja uma legião de subcidadãos. É hora de ação, em larga escala em todo território nacional.